terça-feira, 17 de novembro de 2015

O Voo





Ele espiou através da fechadura e 
quase imperceptivelmente foi picado com cores vivas por 
serpentes ferozes.
Um cérebro ferino,uma dúzia de pensamentos mórbidos
e um sorriso desgastado e pueril.
_ Você crê mesmo que pode flutuar por sobre a cidade e voar com essas asas de brinquedo?
Ele apenas se calou e continuou a caminhar de olhos fechados,sussurrando baixinho.
Sentou na calçada,bebeu um gole de vinho,olhou para o céu e se deitou,adormeceu.
Sonhou com flores,perfumes,sonhou com praias desertas e florestas imensas,sonhou com uma morte pacífica e indolor.
Ele espiou através de sua alma e não enxergou nada,apenas um ruído branco se dissolvendo em metáforas.
Fazia frio,fazia noite,fazia Lua,fazia solidão.
Encharcado de silêncio,ele previu,assim que notou uma mancha no céu,que de fato seu sorriso
embarcara em uma viagem sem volta.
Tentou abafar os pensamentos que borbulhavam feito água fervente.
Tentou sufocar o crescente e embrutecedor ímpeto de saltar para o abismo. 
Assim,quando a avistou,de repente sorriu.
Um lúcido sorriso emprestado.
Vestiu sua alma de coragem.
E rasgou o peito, deixando seu coração saltar arrítmico.
E então ela o tomou nas mãos
E trouxe junto de si.
E o caminhar sozinho não era então tão frígido.
E a solidão em si não era tão díspar.
A madrugada tremia,frágil,quando os dois olhos se fitaram.
E cada um reconheceu seu próprio demônio tatuado na pupila alheia.
E se deram as mãos
E cantaram uma canção que ecoava pelos becos.
E toda a cidade e seus vapores abriram a cortina imaginária.
E dois pássaros antes inertes levantaram vôo.
E uma garoa fina e gelada coroou o amanhecer de suas almas.

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