quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Dia perfeito

Leve meus sonhos onde eles estejam seguros
e me traga um copo vazio...
Tranque suas paixões
seu tempo,sua dose diária de medo
entregue-se,sem algemas, ao delírio imediato...
e sem olhar para trás, identifique-se
sem chorar, sem lágrimas incoerentes
diga o que pensa e se cale
enforque-se com a corda da razão
demita-se do mundo
deite-se,enxugue-se
mate cada minuto de silêncio
mude o tom do teu discurso
encare-se, navegue-se
mutile seus desejos, marque com um "x" cada frase repetida
cada sopro mentiroso de alívio
cada suspiro de decepção
leve suas roupas,suas toalhas sujas
lave seu rosto, sua alma
em em meio a coragem dissidente
em meio as fraquezas e aos suicídios fracassados
planeje uma facada certeira
no coração cambaleante
de um dia perfeito.

A luz apagou...

Eu atravesso teus olhos como lanças
eu me vigio e me enlaço, e tudo que me resta é sussurrar novamente a velha melodia,
ecoando surdamente pelos túneis escuros de nossas almas.
Um dia a mais no calendário estupefato.
um olhar descrente de decepção
um olhar cálido de afeto descontrolado
me ajoelho e sinto o refluxo absurdo de situações e paixões deixadas pela metade
vagando pelo infinito como ondas minúsculas de desconcertadas imagens,
projetadas na parede branca do universo
desgastadas, desbotadas
A luz apagou...
Com medo de trair meus próprios pensamentos, me desespero...
tua visão se encobre
a poeira de anos de solidão
sobe lentamente
um minuto perfura a eternidade
e cada sensatez se disfarça de crueldade
perfazendo quilômetros de nuances mentirosas de vidas vazias
e a fragilidade sucumbe,explodindo no ar...
Em um piscar de olhos, a luz se apaga e a vida tateia no escuro, esperando o fim.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

O Tempo

Tapei a boca do tempo pra ele não gritar
um descuido e o silêncio explode
em gotas eternas e melodias sangrentas.
Hoje teus lábios desenham frases sagradas
e eu mantenho os olhos sobre tua alma
vigiando cada segundo, cada metro, cada degrau
não sou um mártir
não tenho desejos
apenas o máu-hálito do tempo em frente ao meu rosto
murmurando previsões malditas
mastigando verbos decaídos e derramando
saliva, suór e a febre de um dia normal.
tuas mãos, raízes
óbitos,velas, e um segredo perturbador fugindo pelas frestas, se arrastando pelas sombras.
mais um sonho percorrendo minhas veias
mais um veneno injetado na retina
e milhões de minúsculos Sóis me queimando a pele
Soprei o último sentido
Adormeci, velando meu próprio corpo
imensamente entregue a tudo que não era eu.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Devaneios


Esse meu sentimento-alvo,perdido
numa rua suja e escura no centro do meu coração
prevejo uma viagem quase perdida e sem volta
(e aquela música suave no mp3)
A voz rouca de uma senhora idosa contando ao filho os desígnios de Deus
e em meu pensamento eu praguejava e desrespeitava os desígnios de quem quer que seja.
Cerveja,sexo,algumas canções de artistas falidos e poesias deprimentes de poetas mortos.
Uma fumaça fedida de cigarro,um beijo que nem foi cogitado
e de novo eu choro nem sei por quem e para que.
O universo,um minúsculo universo,explodindo retoricamente por entre meu sangue.
Onde está aquele sorriso?
Cavernas de aço
olhos,lábios,esquinas
e o ruído de mil melodias descompassadas
sacrificando e crucificando ordinariamente aquele Cristo estampado na parede.
Bebo um café e grito o mais alto possível
Cabelos,sangue, unhas,uma ferida enorme e aberta no fundo do espírito
(e a dor mal disfarçada entornando reflexos escaldantes por sobre a fria camada de ódio que repeliu e repele toda e qualquer felicidade)
Eloquência inoperante
Maldisse tantas vezes essa virtude
e quem dera me abandonasse sem avisar
num súbito homicídio sem armas, sem sangue, sem medo
Chamei você pelo nome
e quando você me viu se calou e desviou o olhar e atravessou a rua e bateu suas asas para uma dimensão que nem ouso percorrer
Mas te encontro em qualquer esquina,em qualquer sofá, no sonho que não terminei,e na promessa vazia que fiz e que se transformou em destino
e mais uma vez o Sol derramou seus raios na sua janela fechada
e você dormiu,quase cega, na grama alta dos seus devaneios.

Recado

Obviamente não se trata de um recado
Escrito em tom menor ou perdido em uma escuridão proposital
Descartado e apagado entre os cadeados enferrujados da memória
Nem se trata de um sussurro engasgado, previsto e invisível.
Uma palavra não se passa de mão em mão
nem se vira o rosto dissimuladamente para entregar ao ladrão
nem se sequestra versos ou poesias.
E mesmo vendo seu rosto estampado na tela
com o coração palpitando
e um sorriso sincero no olhar
não se trata de uma alma
desmanchada em gestos eternos
manchada e manipulada por deduções absolutas
e um vento quase morno permeia meu peito
desfaz as sequelas, revira os sentimentos, um a um
e nada sobrevive, de pé
obviamente não se trata de um recado
apenas duas linhas de medo transmutado em palavras
assinando em desalinho
um eterno prometer.

Sono Falso

Quantas vezes pensei em voltar aquele lugar,tocar cada objeto e lembrar de todos os segundos que estive em sua companhia,rever as desgraças uma a uma,satisfeito por ter resolvido me enganar até agora e me despedir lentamente da minha última solidão.Quantas vezes me despedi sorrindo e acenando pra ninguém,tropeçando em detalhes,caindo de cara em desatinos,e você, lentamente absorta em devaneios,com as costas marcadas pelo sopro do destino.Olhei em volta e vi tua sombra,deitada sobre o asfalto quente,me desesperando.
Quantas vezes menti friamente pra mim mesmo e acreditei,sonhos são reflexos indubitáveis de desesperanças e vontades perdidas no tempo e eu me entrego a eles como se não houvesse outra saída.
Em frente ao espelho da sala eu olho o relógio,as horas passam calmamente,e em outro segundo estático eu vejo tua imagem, e prefiro cerrar os olhos,encarando o escuro da minha mente, fixamente.Teu lado mais suave, mais frágil,desmoronou por sobre tudo e confirmou a morte presumida de mil deuses.Nada é belo agora, nada é são, nada é milagroso, é tudo uma pilha enorme de lembranças, escorrendo pelo chão e manchando os raios transparentes do Sol.
Quantas vezes me perdi, sorrateiramente, pra me encontrar, antes de mim, pelo terreno deserto do amor, e me iludi, me desesperei, me encontrei e não era eu.
Quantas vezes a paz, companheira sutil, me enlouqueceu e me fez jogar tudo para o alto, num enorme desperdício de alma, e eu batia de frente com Deus, e ignorava o que estava escrito e determinado e ainda assim a beleza de ser traído pela divindade omissa e culpada tinge de negro cada partícula do meu ser, me tornando parte de todo de algo que me é misterioso.
Solte as amarras, traga os vícios, encontre as virtudes, beba o vinho do desespero lentamente, molhe o rosto, abra os olhos, erga a cabeça e fite o infinito, ele está ali, logo a frente, iluminado e arranjado meticulosamente pelas mãos hábeis de um anjo sem asas, e seus dedos atrofiados se estendem para cumprimentar sofregamente e me desejar uma boa sorte, em outra vida, em outra existência, em outra solidão resguardada, em outro mundo,como um ponto final disfarçado de vírgula, esperando um acorde súbito para acabar a música em uma pausa tranquila de um sono falso.

Desabafo

Não existe satisfação total na vida.
Andei pensando sobre o que me faz feliz, ou satisfeito, ou temporariamente tranquilo ao ponto de não desejar sumir.
E tudo parece um semi-orgasmo mítico, que nunca irá se concretizar,sempre inventando placebos, paradoxalmente conscientes.
Resgatando amores antigos, e beijos esquecidos no tempo e situações que bem poderiam estar em outra dimensão, a dimensão distante das lembranças engavetadas.
E tudo sempre poderia ser melhor, aquele discurso elaborado e ensaiado somente dentro da própria cabeça, que espera um momento exato para se libertar, e esse momento nunca chega.
Nada nunca é o que se quer, nunca é o que se espera, nunca se explora o máximo, como uma explosão em contagem regressiva em que o botão vermelho emperra.
E aquele sorriso amarelo das sombras das pessoas,um óculos escuro colocado em frente à vida, pra descansar os olhos e esconder as olheiras profundas.
As conversas e as pessoas,os livros e as músicas,filmes e viagens de fim de semana,as lágrimas derramadas no escuro do quarto,o travesseiro úmido e a alma seca.
Não existe calma,e a motivação infecta de um delírio casual se sobrepõe,ininterruptamente,às satisfações,ou alegrias, mesmo que extremamente sóbrias , conscientes e superficiais.
Não há exceção, não há regra.
E ontem eu esperei o telefone tocar, e ele permaneceu imóvel, como meus olhos, como minhas pernas, e como tudo em volta, espreitando cada ângulo do meu corpo.
Eu lembro de tudo que vivi, tudo que esperei, tudo que quis, tudo que prometi, tudo que ansiei, e tudo parece que foi escrito à lápis em um guardanapo,um recado, um gracejo pra Deus, que o garçom não entregou.
Deus e sua imaginação, Deus e seus discípulos incrédulos.
E ontem ainda lembrei novamente de todas as pessoas, e lembrei de você,e do tempo que desperdicei,e das vozes que ouvi, e tudo que representou,por tanto tempo.
O livro que não escrevi, o talento que acreditei ter,o que represento para cada um que passou por mim, e as palavras que entreguei,para todos eles,meio desconfiado.
E a música que toquei e alguém ouviu, distraidamente,esbarrando nos muros frios e sólidos, e reverberando,ácidas,para se desfazer em ruídos minúsculos dentro de cada
um, dentro de mim, do universo, da calçada suja de uma cidade qualquer.
E eu me vejo só, e olho para o lado e não existe ninguém, não existe humanidade, é apenas um termo, e todos estamos sós e entregues ao mundo e seus significados.
E cada vez mais acredito que pensar é inútil,e nunca nada vai fazer sentido.
Sempre que alguém lê algo assim pensa: é um suicida.
Mas é com uma tranquilidade absurda que entro, pisando suavemente,e assoviando, nesse amplo galpão (e só me alegro e satisfaço totalmente quando constato isso),que é onde não se pensa, não se acha sentido, não se infere nada, não se adivinha,não se lê,não se cria expectativas,não se tenta dar significado a nada, e é aí que tudo, paradoxalmente faz sentido, e nesse caos, nessa ausência total de sentido que se descobre um medo brutal,de se ver perdido e nu,e que é exatamente o que somos.
Não sabemos de onde viemos, pra onde vamos, e o que somos e queremos ser felizes em totalidade?
Repito: não existe satisfação total
E eu sigo sóbrio, errante ,com a consciência tranquila e despreocupado,porque não existem desejos,nem problemas, nem mágoas.
Andei pensando sobre isso, e sobre aquele beijo que podia ter te dado naquele dia, e sobre o que se passa em sua cabeça.
Andei pensando que não dirijo,não gosto de ir no banco, não gosto de igrejas, nem de quem mente a si mesmo.
E quando te abraço,e quando passo a mão em teu rosto,e quando faço alguém rir, e quando desfaço um nó que estava encrustrado na alma pálida de alguém,aí sim me sinto vivo, nesse momento me sinto mais perto da imaginação de Deus.
Ontem ouvi novamente aquela música que me faz chorar, e li um trecho de um livro do Hesse e andei sozinho pelas ruas, sem pensar em nada,apenas andando para que o cansaço físico me satisfizesse quando eu deitasse e encostasse a cabeça no travesseiro, e lembrasse de novo do que eu perdi,daquela paixão que foi embora, daquele amigo que era o mais amigo de todos e sabia de tudo que acontecia, e que agora se perdeu.
A garoa e o frio invadem profundamente minha alma, e eu lembro de quem eu não amei, de quem quis apenas uma palavra minha e eu não dei, de quem queria apenas minha atenção e eu recusei, do abraço que não dei quando os braços esperavam, abertos, de quando não disse para quem eu gosto, que essa pessoa é importante pra mim, e nas brigas idiotas por coisas pequenas, e do orgulho, do não-perdoar, do egoísmo frio, do medo de sentir, do medo de demonstrar, do medo absolutamente desnecessário de se importar, de ir além, de ser.
E eu lembrei por um instante que apesar de nada fazer sentido,há um sentido maior, que nos é incompreensível, e que pode ser Deus, mesmo que ele não exista.
Ou nós somos a imaginação de Deus ou ele é a nossa, e embora nada faça sentido, há uma vida pra viver, e mesmo sem satisfação plena,eu me movo em direção a algo
que pode ser o fim ou o começo.

Luciano Pires

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Caos

Está tudo um caos,e a única maneira condizente de espantar esses fantasmas decorrentes desses inescrupulosos pensamentos é derreter meu cérebro deliberadamente,me aprofundar em um precipício linear,me jogar de olhos fechados nesse turbilhão de vazios e sombras que se encontram parados em minha frente, de braços cruzados e esperando um jorrar de delírios que se transformarão em vozes e essas vozes em silêncios até que se forre o chão com um nada absoluto,e em minha mão ainda resta uma letra de uma palavra de uma frase de uma estrofe de uma poesia que eu nunca vou lembrar, e você me olha espantada e me pergunta milhões de questões e eu nunca encontrarei respostas.Meu cérebro agoniza e chora as lágrimas que meus olhos abdicaram,me previ, me antecipei e não soube utilizar,me vi em frangalhos diante de um espelho escuro.
E hoje é dia 26,um dia qualquer em um universo qualquer,diante da grandeza incólume de um Deus inexistente.
Fiz minhas malas,chorei pelos espíritos que acorrentei,me entreguei quase aflito às dúvidas que brotaram do asfalto,me vesti com aquele casaco surrado,toquei pela última vez aquela música eterna.
Mil segredos revelados,mil tumbas esperando o próximo morto a ressucitar,e as pedras caladas de um desfiladeiro qualquer me enterrarão em uma avalanche póstuma,selando um paradoxo milenar.
Não me envolvo com mitos, tampouco sobrevivo enclausurado em nuances pouco sutis de teorias e lendas,mas o caos instalado me encanta e devolvo mastigado o alimento putrefato feito de crenças e subterfúgios que você me fez acreditar.
Um sistema único,um catastrófico arrebatar de almas perdidas,guiando cegamente aqueles que se encontrarão na praça destruída do mundo que restou.
E eu te vejo,nua,machucada,encostada tristemente num muro de saudades,sangrando pelos poros,te enxergo melancolicamente, te toco com as mãos que você mutilou, e tristemente te vejo se desmanchar no ar, intuitivamente me viro e sigo viagem.
Está tudo um caos e silenciosamente a Terra gira...
Vestido de vertigens,eu vomito, cambaleante,as certezas que tinha antes de tudo vir a desmoronar.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Blue

Enquanto descanso
de mim mesmo
apodreço, relutante
A dor mergulha
sem oxigênio
com a saudade a tiracolo e
me sinto tão desligado de tudo
como se meu umbigo tivesse sido cortado
o que me funde ao universo
me contrai e destrói
dissimulando odores
do que se varreu pra debaixo do céu
a porta aberta,imaculada
e os olhos vigiando o nada
e a beleza trágica de dois segundos sorrindo
dá lugar ao sono brutal
um pesadelo reconfortante
Se ao menos pudesse escolher
se pudesse ler a tinta invisível
com a qual foi escrito o livro mágico da vida
me vejo perdido,mortalmente aceito
e arrastado por ventos escuros e violentos
nada me cura,nada me alimenta
e as cores sobram pra fora da alma
descuidadas
um aborto espontâneo de crenças
um suicídio numa manhã de dezembro
calado como um imã desmagnetizado
sôfrego,desmanchando ,derramando tristezas pelo caminho
e sua imagem me vem como uma miragem em preto e branco
um espelho quebrado em mil pedaços
Descobri tardiamente que nada vai estancar
o sangue que meus olhos vertem
iluminados pela dor estagnada da certeza
que nada vai voltar.

domingo, 27 de janeiro de 2008

Deus

Praguejei metáforas...
Deus me aconselhou a não fazê-lo
Me neguei a ouví-lo
Da minha boca voaram frases caladas
Bocejei um riso tímido
Voltei quase criança pra dentro do meu cobertor de pétalas
Estava a ouvir a mesma música prepotente de outrora, ouvidos inúteis, instrumentos escondidos.
Protegi meu rosto e dancei descompassado, não quero olhar seu sangue, suas vísceras á mostra, desviei o olhar.
O medo oblíquo de enxergar sentido onde não há nem razão.
E as partes do sonho que eu havia entendido se tornaram amnésia fecunda nos recônditos selvagens de minha mente.
Derramei planos por cima de abismos,mortalmente me entendi.
Derrotado por mim mesmo em semi-círculos distantes e inconectáveis.
Pés descalços enfrentando as brasas vivas encrustradas nas nuvens maculadas do céu
Estranho céu,sob meus pés e acima dos Deuses.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Instantes

Um último sentido racional antes de enlouquecer febrilmente permeado de sentinelas recobertos de frases feitas.
Um pedaço desse bolo cifrado,criptografado?
um embrulho no estômago vazio e milhares de vozes esquizofrênicas gritando no alto-falante da minha mente.
Sem repouso, fraco e gritantemente nauseabundo.
Você me pede um beijo, minha boca treme e se distancia...
olhar em seus olhos é como um mergulho sem volta na mais absurda delícia de inconsciências e jargões psicológicos.
Psicossomático, mas feliz,escondido entre as amarras frágeis dos maledicentes sonhos.

Anjo Cego

Tive um sonho com você
e ao acordar a solidão era tanta que adormeci novamente,
pra acordar só se for ao seu lado.
uma certeza duvidosa de que tudo vai dar certo
um milagre rotineiro, desinteressante
um abotoar de asas gastas e cansadas
um anjo cego e mudo.
me deem suas bençãos, suas alegrias sem nexo
me contento com o timbre apagado da sua voz
a beleza ininterrupta de sonhos mal vividos
e vidas mal sonhadas.
Tive um sonho com você
e ao perceber o medo, corri de volta ao útero frio dos meus pensamentos
e a alma suportou apenas um beijo venenoso do passado,
um afagar maldito de mãos ásperas.
um adormecer sôfrego
um salto infinitamente curto
em direção ao cínico corredor da saudade.
(Luciano Pires)

Memória

Aquele sopro de saudade inconsistente...
um alvorescer óbvio.
E seu rosto desbotou ,numa memória fajuta...
Ouvi pela segunda vez a voz cega do meu vício
e nesse instante me pareceu menos única aquela frase que sussurrei.
Me beije em pensamento.
Me olhe, me toque.
Um espelho de costas, refeletindo o abismo.
te dei a mão,te dei asas.
te dei um arco-íris preto e branco.
te dei milagres.
Aquele breve esvoaçar de imagens...
seus olhos fechados,seu gosto...
e apenas um eco infinitamente sobreposto.
dei de comer a mil monstros
sobrevivi.
E ainda hoje vejo a minúscula linha que equilibra a Lua
linda e pálida, sobre nossas cabeças.
Luciano Pires

Desire

Me atormenta te ver intranquila,rangendo os dentes freneticamente como se estivesse por morrer...te deixei ver entre a porta entreaberta, um risco de sangue no chão,quase negro,deslizando como uma serpente por entre os pés pálidos da estátua no canto da sala...tua garganta ainda tem as marcas suaves dos meus dedos...um odor silencioso de sombras cruas e distorcidas permeia toda a sala...meu sussurro invade teus ouvidos...teus olhos fixos.
_ Foi por você que meus pés caminharam até aqui...
Não obtive resposta...teus cabelos negros tingiam e abraçavam o tapete da sala...
Corri brevemente por entre meus pensamentos...te estendi a mão, ela deslizou por entre meus dedos.
Tua boca exalava fétidos poemas de amor, eu aspirava tudo,ansiosamente.
Teu sexo gélido...tua face sorria mentindo certezas e eu me envolvi sordidamente entre teus braços.
Te possuí calmamente,sutilmente adentrei teu universo perdido,tua alma em desuso.
Me atormenta teu olhar vazio, tua incerteza maldita,tua fragilidade indócil, teu mal-estar mágico.
Seria apenas um beijo fútil,ardendo meus lábios, e neles depositaria todo o asco e toda a delicadeza de uma vida.
Luciano Pires

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