Saber mais sobre a trajetória de um escritor que começou se auto publicando até chegar à ser publicado por uma editora reconhecida e reverenciada em seu nicho, o Terror, é a função dessa entrevista, além de perguntar o que geralmente não perguntam , sobre o processo da produção textual.
Cesar topou responder algumas perguntas e saciar nossa curiosidade.
Antes, uma breve biografia do autor, escrita por L Brisa:
Cesar Bravo é um autor brasileiro nascido em 1977 que insiste em se manter fiel ao que gosta de fazer. Poucas vezes desfrutei de autores nacionais com uma atitude tão honesta e perseverante quando a dele. É autor e co-autor de contos, romances, enredos, roteiros e blogs. Cesar também brinca um pouco com o violão, mas já o aconselhei que continue escrevendo...
O conheci há quatro anos, quando li um de seus textos publicado em um jornal da cidade. Minha primeira impressão foi: “O escritor mais azedo que eu já li”, mas isso só durou até conhecer melhor seu trabalho. É inegável seu talento com as palavras e a quantidade de emoção que é capaz de evocar em seus leitores. Também é impressionante como já disse, sua perseverança em defender gêneros espinhosos como o suspense e o terror aos quais se dedica mais fortemente.
Confesso que fiquei surpreso quanto fui convidado para falar um pouco de seu trabalho (somos praticamente concorrentes), mas também me senti honrado. Anotem esse nome, senhores. Cesar Bravo ainda vai dar muito mais o que falar no cenário literário nacional viciado e insosso que temos hoje. Já confirmou seu nome em mais de oito volumes de coletâneas com outros autores, a maioria pela editora Multifoco Sul e Rio. Também tem seus Romances e outras obras vendidas pela Amazon.com.
Leiam esse escritor antes de ignorá-lo ou trocá-lo (como ele mesmo diz) por “qualquer gringo cheio da nota e sem escrúpulos na caneta”
Bem, a primeira
pergunta diz respeito a trajetória na escrita, como surgiu o interesse por
escrever e como foi até chegar a ser publicado pela DarkSide?
O interesse pela escrita surgiu muito cedo, inicialmente em
tom pessoal, eu costumava desabafar minhas frustrações e anseios no papel.
Também desenvolvi o mau hábito de rasgar esses materiais, o que me causa
arrependimento até hoje.
Comecei a tratar a escrita com a seriedade que ela merece
bem tarde, por volta dos trinta anos. Até então eu não tinha segurança para
expor meus textos, me faltava bagagem e um pouco de ousadia. Em 2013 expus meus
primeiros trabalhos, em grupos de escrita, blogs e, sequencialmente, na Amazon.
Também procurei parceiros que poderiam endossar meu trabalho, foram essas
pessoas que me colocaram em evidência e me ajudaram a vender os livros
publicados em e-book.
Sobre a DarkSide, sempre tive interesse em publicar meus
livros com eles. Difícil? Sem dúvida, mas eu não gosto de me colocar barreiras.
Enviei materiais, continuei compondo minhas coletâneas e romances, consegui
mais parceiros para me fortalecer na rede. Em 2015 recebi uma ligação da
DarkSide, nos reunimos e fechamos um primeiro livro. Posso dizer que estou
muito feliz com a parceria. Estou em excelentes mãos.
Nós temos um grupo onde é quase um tubo de ensaio, nos reunimos para estudar estrutura e linguagem, fluidez, diálogos, o micro. Eu desconhecia completamente a estrutura. E estou aprendendo com um pessoal mais jovem exatamente sobre isso. Há uma polaridade que percebi ser bem evidente entre escritores com uma formação de Letras, mais fundamentados na linguagem, linguística, tudo relacionado a língua em si, mas que desconhece fundamentos de roteiro e por vezes desprezam esse conhecimento da estrutura, como se isso fosse prejudicar a pureza da escrita, deturpar a integridade artística. O que pensa sobre isso?
Nós temos um grupo onde é quase um tubo de ensaio, nos reunimos para estudar estrutura e linguagem, fluidez, diálogos, o micro. Eu desconhecia completamente a estrutura. E estou aprendendo com um pessoal mais jovem exatamente sobre isso. Há uma polaridade que percebi ser bem evidente entre escritores com uma formação de Letras, mais fundamentados na linguagem, linguística, tudo relacionado a língua em si, mas que desconhece fundamentos de roteiro e por vezes desprezam esse conhecimento da estrutura, como se isso fosse prejudicar a pureza da escrita, deturpar a integridade artística. O que pensa sobre isso?
Penso que toda ferramenta é útil. Um conhecimento da língua
é fundamental, afinal, estamos falando de escritores. É impraticável enviar um
texto com erros esdrúxulos a uma editora, é preciso um mínimo de conhecimento
para, pelo menos, passar pelo crivo inicial dos editores. O problema que vejo
está no abuso da língua, no uso de “palavras e expressões mortas” ou que exigem
um dicionário para a compreensão — isso pode tornar um texto enfadonho, lento e
chato.
Sobre a estrutura, existem várias fórmulas, inúmeras dicas
sobre como compor o texto. O mais importante para mim é adequar forma e
conteúdo. O escritor deve conhecer a estrutura básica de um conto ou romance
quando se propõe a escrevê-los. Veja bem, conhecer não significa ficar preso, e
sim, saber o que estamos fazendo. Não gosto muito de seguir fórmulas rígidas, o
que tento fazer é usar essas fórmulas quando preciso, quando elas, de alguma
maneira, tornam meu texto mais interessante.
Sobre os roteiros, também existem regras, nós não podemos
simplesmente jogar nossas ideias com a formatação que bem entendemos se
quisermos ter alguma chance de publicação. No caso dos roteiros novamente, o
mercado exige um padrão, é preciso segui-lo ou pelo menos se aproximar dele.
A fluidez vem com a prática, com o dia a dia. É como falar,
se você não tivesse praticado, não seria capaz de colocar as palavras de uma
maneira que fosse compreendido. Sobre os diálogos, a principal ferramenta é a
observação. Para compor diálogos críveis, é preciso ouvir as pessoas. Outro
ponto sobre os diálogos é a pontuação correta. Eu canso de ler materiais que
usam travessões e aspas de maneira errada. Como disse anteriormente, o escritor
precisa dominar as ferramentas básicas da língua.
A literatura de
gênero sempre foi marginalizada, desde os pulps, giallos e sc-fis ditas
literaturas menores em relação a grande literatura, universal, eterna houve
poucos casos onde se cruzaram hoje ainda é visto assim na tua opinião?
Creio que são públicos diferentes, e cada lado escolhe seus
autores. O que me fere um pouco é a flagelação consciente dessa ou daquela
vertente. Muitos críticos torcem o nariz para a modernidade, envenenam os
jornais, eles ainda estão enraizados em um mundo que, apesar de magnífico para
muitos, tem a necessidade de evoluir. Vivemos na era da informação, tudo é
muito rápido, ninguém tem tempo a perder. As pessoas querem compreender e ser
compreendidas, textos considerados “Grandes e Eternos” podem irritar a nova
geração de leitores, ainda que leitores de longa data saibam apreciá-la. Não
gosto dessa polarização, ela sempre gera agressão, o mercado brasileiro tem
espaço para todos os tipos de escritores. Eu leio Machado de Assis e não abro
mão de Stephen King, gosto de Graciliano Ramos e amo Bukowski; tenho muitos
livros do Paulo Coelho em minha estante, é por aí...
Como fazer um livro
comercial e ainda ter em vista uma boa construção de personagens e temas
relevantes? Ou é entretenimento mesmo e basta divertir e vender?
Veja bem, um livro com bons personagens e temas relevantes
será comercial de qualquer jeito, ele venderá se for bom e tiver a publicidade
bem feita. O que fica um pouco complicado são livros mal escritos, mal
editados, que pecam em trama, personagens e em todo o resto, esses exemplos nem
o melhor publicitário do mundo conseguirá salvar. Eles vão encalhar, não por
que não são “comerciais” ou “ficcionais” ou “modinha”, mas porque são ruins.
Alguns autores
publicam livros com erros crassos de português, por grandes editoras, muitas
passagens do livro poderiam ser melhoradas com um bom editor, pra você qual o
papel do editor hoje em dia, ainda existem bons editores?
Existem editores fantásticos. Eu tive a sorte de conhecer
alguns.
O problema com a versão final do livro muitas vezes não está
centralizado em uma só pessoa. Algumas editoras contam com até quatro
profissionais trabalhando em um mesmo texto, além do autor. Mudanças são
sugeridas e executadas, o material troca de mãos muitas vezes, creio que seja
natural que um ou outro errinho escape na impressão do livro. Quem já revisou
um texto longo sabe como é complicado, chega um ponto em que nossos olhos
simplesmente não reconhecem alguns erros.
O papel do editor é explorar ao máximo a qualidade de um
livro. O editor precisa ter essa visão sobre o que agrega ou deprecia, sobre o
que evolui ou mata uma obra. E o autor por sua vez precisa ouvir esses
profissionais. Como Stephen King citou algumas vezes, “Escrever é humano,
editar é divino”. Em minha opinião, o editor também tem um papel fundamental na
evolução do autor. Isso inclui posicionamento na rede, network, descoberta de
novos parceiros e projetos, o bom editor é aquele profissional que atua
conjuntamente com seus autores.
Esse processo de
aprendizado de estrutura, como se deu para você? É mais intuitivo ou apenas
começa um livro com todo o planejamento? Isso se deu logo quando começou?
Aprendi os fundamentos traduzindo material técnico, pois não
encontrava quase nada por aqui. Existem bons livros com essa finalidade,
aconselho a todos que aprendam tanto quanto for possível.
Já escrevi de várias formas, mas ainda é um processo muito
intuitivo para mim. Não costumo planejar, quase nunca sei como vai terminar,
todo o processo de reestruturação, quando necessário, é realizado na segunda ou
terceira leitura/reescrita. Ficar preso a fórmulas ou planejamentos rígidos de
cenas/capítulos em um primeiro rascunho tem um efeito muito negativo sobre o
meu trabalho.
A construção dos
diálogos, como se dá em sua escrita?
Eu reproduzo o que ouço; tento encaixar minhas experiências
com o tipo de personagem que eu idealizei. Alguém que vende peixes em uma feira
de Minas Gerais tem a fala muito diferente de um diplomata de Brasília, é
preciso ouvir essas pessoas e tentar ser o mais fiel possível à realidade, é o
que eu faço.
Quais suas
influências?
Poe, Lovecraft, King, Clive Barker e Bukowski.
Ainda há espaço para
escritores que criam literatura de gênero no Brasil?
Há muito espaço. O problema está na qualidade dos textos. Os
editores recebem enxurradas de material, mas pouquíssimos passam para uma
segunda avaliação. O pessoal que realmente possui qualidade de escrita acaba
sendo publicado, é questão de tempo. Outro problema seríssimo é a
originalidade, muitos escritores tem o mau hábito de copiar autores
consagrados, muitas vezes sem perceber e algumas vezes descaradamente. O
mercado busca originalidade, sempre.
O escritor recluso,
como Salinger, ainda consegue sobreviver nos dias atuais, como é teu contato
com leitores nas redes sociais?
Acho que não. Hoje existe uma turbulência de autores, todos
buscando seu espaço, usando suas redes sociais para promoverem seus trabalhos.
Dificilmente eu teria sido publicado sem a ajuda dos meus parceiros e
seguidores. Mesmo as editoras, elas buscam segurança em suas publicações.
Muitas vezes um número considerável de seguidores e o correto posicionamento do
autor na rede faz toda diferença.
Mantenho um contato muito próximo nas redes sociais, sempre
estou disponível. Recebo fotos, resenhas, elogios e críticas, todos são
respondidos.
Mais uma pergunta:
livro físico versus e-book, prós e contras, sua visibilidade mudou quando foi
publicado por uma editora?
Leio nos dois formatos, por praticidade leio mais e-books.
O livro físico, por outro lado, gera encantamento, é um
produto com uma alta dose de apreço e, eu diria, romantismo. Temos o cheiro, o
toque, a capa que muitas vezes é o fator de decisão na compra; livro ainda é
produto de consumo. O grande mérito dos ebooks é sua praticidade e a facilidade
de publicação. O grande problema é que nenhum autor brasileiro consegue
sobreviver com o rendimento dos livros eletrônicos, e a pirataria tira o que
pouco que sobra. O livro físico oferece uma possibilidade muito melhor nesse
sentido.
Minha visibilidade aumentou muito, muito mesmo. E continua
aumentando. Com o livro nas principais livrarias, o autor é mais visto e mais
respeitado, é uma mudança drástica e muito positiva.
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